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O combate à pirataria no atacado: é possível buscar algum tipo de responsabilização dos proprietários de shoppings que vendem itens falsificados?


 

Apesar das frequentes notícias relatando apreensões de produtos falsificados no Brasil, o combate à pirataria no país se parece muitas vezes com o processo de enxugar gelo. Em diversas cidades brasileiras, há feiras e shoppings especializados na venda de produtos falsificados. Operam com o conhecimento geral da população e, salvo raras exceções[1], parecem imunes às batidas policiais, as quais focam na apreensão de mercadorias e na responsabilização penal das pessoas que alugam os espaços para as expor à venda.

É possível buscar algum tipo de responsabilização dos proprietários destes shoppings e feiras que, de maneira geral, alugam espaços para quem vende itens falsificados? No direito comparado, com suporte nos institutos da responsabilidade vicária e contributiva, já há muito tempo se entende que, sim.

Em um dos casos mais famosos a respeito, a Fonovisa Inc, empresa sediada em Los Angeles, titular de direitos autorais e de marca de diversos produtos latinos, processou os donos e administradores de uma feira, na qual frequentemente eram vendidas mercadorias falsificadas. Alegaram que o proprietário e gerentes deveriam ser responsabilizados porque sabiam das irregularidades cometidas por quem alugava os stands, as incentivavam e, de forma indireta, se beneficiavam financeiramente com as vendas efetuadas.[2]  

O Tribunal Federal na Califórnia condenou os proprietários e administradores da feira exatamente com base nos institutos da responsabilidade vicária e contributiva. Considerou que o acesso do público era controlado e cobrado pelos administradores da feira que também tinham o direito de encerrar o contrato de aluguel com os lojistas em caso de irregularidades, podendo, desse modo, fiscalizá-los. Com base ainda no volume de mercadorias falsificadas apreendidas e no número de vezes em que constatadas as vendas ilícitas, entendeu que não seria possível aos infratores cometer a violação sem o suporte material dos administradores da feira, o qual incluía a concessão de espaço para os lojistas, estacionamento para eles e os clientes, propaganda e auxílio no transporte das mercadorias.

Na common law, a responsabilidade contributiva é atribuída a alguém que, embora não pratique diretamente uma violação à propriedade intelectual, de forma consciente, induz, incentiva ou confere efetivo suporte material para que a ofensa seja praticada por terceiro. [3] Segundo Nelson Rosenvald, a responsabilidade contributiva “ocorre quando o agente não pratica a violação contra a propriedade imaterial de forma direta, todavia, como o próprio nome sugere, contribui para o ilícito alheio, incitando a sua prática”. [4]

Já a responsabilidade vicária é um tipo de responsabilidade objetiva pela prática de ato de terceiro e, de modo amplo, se configura sempre que alguém obtém benefício econômico com a atividade do infrator direto de direitos intelectuais e tem o direito, a habilidade ou o dever de supervisiona-lo, mas deixa de fazê-lo. É imposta se atendidos os seguintes requisitos: a) interesses econômicos entrelaçados entre o infrator direto e o réu; b) lucratividade do réu obtida a partir dos ilícitos praticados por terceiro; e c) ausência do exercício do poder de controle ou de mitigação de danos, quando o réu poderia fazê-lo. [5]

No Brasil, o Superior Tribunal de Justiça já debateu a possibilidade de se impor a responsabilidade contributiva e vicária a um provedor de aplicação (Orkut) em virtude da venda de produtos piratas pelos usuários da rede social (aulas de direito em vídeo produzidos por um cursinho). Embora os dois tipos de responsabilidade tenham sido afastados no caso analisado, o STJ deixou evidente a possibilidade de condenação de eventuais réus com suporte nestes institutos, na hipótese de o caso possuir circunstâncias diversas. [6]

Em âmbito digital, de fato, há uma enorme polêmica em todo mundo sobre a responsabilidade das plataformas digitais pelos ilícitos à propriedade intelectual praticados pelos usuários da rede, o qual envolve entre outras questões o debate sobre o que constitui suporte material, quando a plataforma tem efetivo conhecimento dos ilícitos praticados na rede e quando há efetivo direito/dever de fiscalização sobre as atividades do usuário.

No mundo real, não obstante, salta aos olhos a possibilidade de se ajuizarem ações cíveis buscando a responsabilização dos donos e administradores dos conhecidos shoppings e feiras especializadas na venda de produtos piratas, os quais estão presentes na maioria das grandes cidades do país.

Primeiro, porque o Superior Tribunal de Justiça indicou que as responsabilidades contributiva e vicária já decorrem da legislação em vigor e, de fato, ambos os institutos estão amparados na interpretação sistemática dos artigos 104 da Lei n° 9.610/98, 186 e 927, par. único do Código Civil. Segundo, porque a situação dos shoppings e feiras especializadas na venda de produtos piratas é bastante similar à de diversos precedentes nos quais a aplicação dos institutos contribuiu para assegurar a devida responsabilização de todos os envolvidos.

O ajuizamento de ações cíveis de forma integrada com as ações de combate à pirataria que já vêm sendo efetuadas pode tornar a proteção dos direitos intelectuais mais eficiente, pois, muitas vezes, é inviável buscar no varejo a responsabilização de cada um dos inquilinos de lojas e stands de vendas. O direito civil, assim, pode atuar no atacado para atingir o patrimônio de alguns dos grandes beneficiários da comercialização de produtos pirateados e garantir a reparação dos titulares de direitos intelectuais.

Publicado originalmente no site jurídico JOTA



[1] O recente fechamento de shopping em São Paulo depois de operação contra a pirataria parece constituir exceção à regra geral. Neste sentido, Cf. https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2019/02/14/shopping-25-de-marco-e-vistoriado-em-operacao-contra-produtos-piratas.ghtml

[2] Fonovisa, Inc v. Cherry Auction, Inc, 76 F.3d 259 (9th Cir. 1996). Em relação ao direito autoral, o conceito de responsabilidade vicária foi moldado a partir do julgamento de Shapiro, Bernstein and Co. v. H. L. Green Co., 316 F.2d 304 (2d Cir. 1963). No caso, uma das lojas franqueadas de uma rede de discos estava vendendo gravações falsificadas. O Tribunal buscou moldar um princípio para que o demandante possa fazer valer seus direitos autorais contra um réu cujos interesses econômicos estão intimamente entrelaçados com os do infrator direto, ainda que o réu não seja o empregador deste infrator. O Tribunal ainda analisou o caso a partir de precedentes chamados “dance hall cases”, segundo os quais o dono de uma boate ou salão de festas pode ser objetivamente responsabilizado por violações a direitos autorais cometidas por artistas que lá se apresentam quando obtém benefício financeiro (lucro) da audiência que assiste o artista que violou os direitos autorais. Cf. Dreamland Ballroom, Inc. v. Shapiro, Bernstein & Co., 36 F.2d 354 (7th Cir. 1929)

[3] Neste sentido, cf. também: Gershwin Publishing Corp. v. Columbia Artists Management, Inc., 443 F.2d 1159 (2d Cir. 1971)

[4] ROSENVALD, Nelson. Responsabilidade Vicária e Responsabilidade Contributiva. In. https://www.nelsonrosenvald.info/single-post/2015/12/08/Responsabilidade-vic%C3%A1ria-e-responsabilidade-contributiva. Acesso em 12 de fev.

[5] A principal distinção entre os dois institutos é o fato de que na responsabilidade vicária não se perquiri sobre conhecimento do réu a respeito das atividades do infrator direto. Na responsabilidade contributiva, por outro lado, há necessidade de provar a contribuição para o ato e a ciência da finalidade antijurídica. Apesar desta diferença, na common law, ambos os institutos são como primos próximos e se apresentam de forma conjunta e intrincada em diversos dos casos sobre ofensa à propriedade intelectual.

[6] STJ. REsp 1512647/MG, rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, julgado em 13/05/2015, DJe 05/08/2015

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